Liberdade
e solidariedade
1. A
liberdade precisa de uma ligação primordial a uma instância superior. O fato de
haver valores que não são de modo algum manipuláveis, é a verdadeira garantia
da nossa liberdade. O homem que se sente vinculado à verdade e ao bem, estará
imediatamente de acordo com isto: a liberdade só se desenvolve na
responsabilidade face a um bem maior. Um tal bem só existe para todos juntos;
por conseguinte, devo interessar-me sempre também dos meus vizinhos. A
liberdade não pode ser vivida na ausência de relações.Na convivência humana, a
liberdade não é possível sem a solidariedade. Aquilo que faço a dano dos
outros, não é liberdade, mas uma ação culpável que prejudica aos outros e deste
modo, no fim de contas, também a mim mesmo. Só usando também as minhas forças
para o bem dos outros é que posso verdadeiramente realizar-me como pessoa
livre. E isto vale não só no âmbito privado mas também na sociedade.
Berlim,
22 de setembro de 2011.
Direito
razão e natura
2. Servir
o direito e combater o domínio da injustiça é e permanece a tarefa fundamental
do político. Num momento histórico em que o homem adquiriu um poder até agora
impensável, esta tarefa torna-se particularmente urgente(…). Foi na base da
convicção sobre a existência de um Deus criador que se desenvolveram a idéia
dos direitos humanos, a idéia da igualdade de todos os homens perante a lei, o
conhecimento da inviolabilidade da dignidade humana em cada pessoa e a
consciência da responsabilidade dos homens pelo seu agir. Estes conhecimentos da
razão constituem a nossa memória cultural. Ignorá-la ou considerá-la como mero
passado seria uma amputação da nossa cultura no seu todo e privá-la-ia da sua
integralidade. A cultura da Europa nasceu do encontro entre Jerusalém, Atenas e
Roma, do encontro entre a fé no Deus de Israel, a razão filosófica dos Gregos e
o pensamento jurídico de Roma. Este tríplice encontro forma a identidade íntima
da Europa. Na consciência da responsabilidade do homem diante de Deus e no
reconhecimento da dignidade inviolável do homem, de cada homem, este encontro
fixou critérios do direito, cuja defesa é nossa tarefa neste momento histórico.
Berlim,
22 de setembro de 2011.
O horror
nacional-socialista
3. Neste
lugar, é igualmente necessário trazer à memória o pogrom da
«noite dos cristais», de 9 para 10 de Novembro de 1938. Poucas foram as pessoas
que perceberam toda a dimensão daquele acto de desprezo humano como o percebeu
o arcipreste da Catedral de Berlim, Bernhard Lichtenberg, que, do púlpito da
Catedral de Santa Edwiges, gritou: «Fora o Templo está em chamas; também isso é
uma casa de Deus». O regime de terror do nacional-socialismo baseava-se num
mito racista, do qual fazia parte a rejeição do Deus de Abraão, de Isaac e de
Jacob, do Deus de Jesus Cristo e das pessoas que acreditavam n’Ele. (...) A
mensagem de esperança, que os livros da Bíblia hebraica e do Antigo Testamento
cristão transmitem, foi assimilada e desenvolvida de modo diverso por judeus e
cristãos. «Depois de séculos de contraposição, reconhecemos como nossa tarefa
fazer com que estes dois modos de nova leitura dos escritos bíblicos – o
cristão e o judaico – dialoguem entre si, para se compreender retamente a
vontade e a Palavra de Deus» (Jesus de Nazaré – Parte II: Da Entrada em
Jerusalém até à Ressurreição, p. 38). Numa sociedade cada vez mais
secularizada, este diálogo deve reforçar a esperança comum em Deus. Sem tal
esperança, a sociedade perde a sua humanidade.
Berlim,
22 de setembro de 2011.
Permanecer
em Cristo
4. Alguns
olham para Igreja, detendo-se no seu aspecto exterior. Então ela aparece-lhes
apenas como uma das muitas organizações presentes numa sociedade democrática;
e, segundo as normas e leis desta, se deve depois avaliar e tratar inclusive
uma figura tão difícil de compreender como é a «Igreja». Se depois se vem
juntar ainda a experiência dolorosa de que, na Igreja, há peixes bons e maus,
trigo e joio, e se o olhar se fixa nas realidades negativas, então nunca mais
se desvenda o mistério grande e belo da Igreja.
(…)Permanecer
em Cristo significa, como já vimos, permanecer na Igreja. A comunidade inteira
dos crentes está firmemente unida em Cristo, a videira. Em Cristo, todos nós
estamos conjuntamente unidos. Nesta comunidade, Ele sustenta-nos e, ao mesmo
tempo, todos os membros se sustentam uns aos outros. Juntos resistimos às
tempestades e oferecemos proteção uns aos outros. Não cremos sozinhos, cremos
com toda a Igreja.
Berlim,
22 de setembro de 2011.
A
dimensão pública da religião
5. Muitos
muçulmanos atribuem grande importância à dimensão religiosa. Às vezes, isto é
interpretado como uma provocação, numa sociedade que tende a marginalizar este
aspecto ou, quando muito, admiti-lo na esfera das opções privadas dos
indivíduos.
A Igreja
Católica empenha-se, firmemente, para que seja dado o justo reconhecimento à
dimensão pública da pertença religiosa. Trata-se de uma exigência que não se
torna irrelevante pelo fato de aparecer no contexto duma sociedade majoritariamente
pluralista. Nisso, há que estar atento para que se mantenha sempre o respeito
do outro. Este respeito recíproco cresce somente na base de um entendimento
sobre alguns valores inalienáveis, próprios da natureza humana, sobretudo a
dignidade inviolável de cada pessoa como criatura de Deus. Tal entendimento não
limita a expressão das diversas religiões; pelo contrário, permite a cada um
testemunhar e propor aquilo em que crê, não se subtraindo ao confronto com o
outro.
Berlim,
22 de setembro de 2011.
As coisas
importantes para o verdadeiro ecumenismo
6. A
coisa mais necessária para o ecumenismo é primariamente que, sob a pressão da
secularização, não percamos, quase sem dar por isso, as grandes coisas que
temos em comum, que por si mesmas nos tornam cristãos e que nos ficaram como
dom e tarefa. O erro do período confessional foi ter visto, na maior parte das
coisas, apenas aquilo que separa, e não ter percebido de modo existencial o que
temos em comum nas grandes diretrizes da Sagrada Escritura e nas profissões de
fé do cristianismo antigo. Para mim, isto constitui o grande progresso ecumênico
dos últimos decênios: termo-nos dado conta desta comunhão e, no rezar e cantar
juntos, no compromisso comum em prol da ética cristã face ao mundo, no
testemunho comum do Deus de Jesus Cristo neste mundo, reconhecermos tal
comunhão como o nosso comum e imorredouro alicerce.É certo que o perigo de a
perder não é irreal.
Erfurt,
23 de setembro de 2011.
O
ecumenismo não se baseia em vantagens e desvantagens
7. Nas
vésperas da minha visita, falou-se diversas vezes de um dom ecumênico do
hóspede que se esperava da visita em questão. Não é preciso especificar os dons
mencionados em tal contexto. A propósito, quero dizer que isto – como na
maioria dos casos se apresentava – constitui um equívoco político da fé e do
ecumenismo. Quando um Chefe de Estado visita um país amigo, geralmente a sua
vinda é antecedida por contatos das devidas instâncias que preparam a
estipulação de um ou mesmo vários acordos entre os dois Estados: ponderando
vantagens e desvantagens chega-se a um compromisso que, em última análise, aparece
vantajoso para ambas as partes, de tal modo que depois o tratado pode ser
assinado. Mas a fé dos cristãos não se baseia numa ponderação das nossas
vantagens e desvantagens. Uma fé construída por nós próprios não tem valor. A
fé não é algo que nós esquadrinhamos e concordamos.
Erfurt,
23 de setembro de 2011.
No
coração de Maria
8. Uma
particularidade da imagem miraculosa de Etzelsbach é a posição do Crucificado.
Na maior parte das representações da Pietà, Jesus morto jaz com a
cabeça virada para a esquerda. Deste modo, o observador pode ver a ferida no
lado do Crucificado; aqui em Etzelsbach, ao contrário, a ferida está escondida,
justamente porque o cadáver está virado para o outro lado. Parece-me que, em
tal representação, se esconde um profundo significado, que só se desvenda numa
atenta contemplação: na imagem miraculosa de Etzelsbach, os corações de Jesus e
da sua Mãe estão voltados um para o outro; estão junto um do outro. Trocam
entre si o seu amor. Sabemos que o coração é também o órgão de uma sensibilidade
mais delicada pelo outro, bem como o órgão da compaixão íntima. No coração de
Maria, há o espaço para o amor que o seu divino Filho quer dar ao mundo.
Erfurt -
Etzelsbach, 23 de setembro de 2011.
Fonte: Zenit
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