Recebeu hoje, no Vaticano, as credenciais para Novo Embaixador junto à Santa Sé, Sua Excelência, o Sr. Almir Franco de Sá Barbuda. O novo Embaixador é viúvo, tem 68 anos e dois filhos, natural de Manaus (AM) e formado em Direito pela PUC-Rio. Sua última função foi Cônsul Geral do Brasil nos EUA. O Embaixador Sá Barbuda escutou de Bento XVI um discurso bem vivo e claro, onde o Pontífice defendeu o ensino religioso confessional para o Brasil e uma "sã laicidade" que não relegue a religião ao âmbito privado, mas que também possa ser professada na esfera pública. O recado do Papa é claro: laicidade não é laicismo; O Estado deve ter independência da religião, mas não pode destruí-la, persegui-la ou cercear seu campo de ação. O Papa sabe muito bem dos perigos do laicismo no Brasil e expõe, sem rodeios, ao Executivo, Legislativo e Judiciário, qual o papel do Estado e da Igreja na sociedade. Confira o discurso completo de Sua Santidade, o Papa Bento XVI.
Senhor
Embaixador,
Ao receber as Cartas Credenciais que o
designam como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República
Federativa do Brasil junto da Santa Sé, apresento-lhe respeitosos cumprimentos
de boas-vindas e agradeço-lhe as significativas palavras que me dirigiu, nelas
manifestando os sentimentos que lhe vão na alma ao iniciar esta sua nova
missão. Vi com grande satisfação as saudações que me transmitiu da parte de Sua
Excelência a Senhora Presidente da República Dilma Rousseff, pedindo ao Senhor
Embaixador a amabilidade de fazer-lhe chegar a minha gratidão pelas mesmas e
certificar-lhe dos meus deferentes votos do melhor êxito no desempenho da sua
alta missão, bem como das minhas orações pela prosperidade e bem-estar de todos
os brasileiros, cujo carinho experimentado na minha visita pastoral de 2007
permanece indelével nas minhas lembranças. Registro com vivo apreço e profundo
reconhecimento a disponibilidade manifestada pelas diversas esferas
governamentais da Nação, bem como da sua Representação diplomática junto da
Santa Sé, para apoiar a XXVIII Jornada Mundial da Juventude que se realizará,
se Deus quiser, em 2013 no Rio de Janeiro.
Como recordava o Senhor Embaixador, o Brasil,
pouco tempo depois de despontar como Nação independente, estabeleceu relações diplomáticas
com a Santa Sé. Isso nada mais era senão o desbordar da fecunda história
conjunta do Brasil com a Igreja Católica, que teve início naquela primeira
missa celebrada no dia 26 de abril de 1500 e que deixou testemunhos em tantas
cidades batizadas com o nome de Santos da tradição cristã e em inúmeros
monumentos religiosos, alguns deles elevados a símbolo de identificação mundial
do País como a estátua do Cristo Redentor com seus braços abertos, num gesto de
bênção à Nação inteira. Porém, mais do que construções materiais, a Igreja
ajudou a forjar o espírito brasileiro caracterizado pela generosidade,
laboriosidade, apreço pelos valores familiares e defesa da vida humana em todas
as suas fases.
Um capítulo importante nesta frutuosa
história conjunta foi escrito com o Acordo assinado entre a Santa Sé e o
Governo Brasileiro, em 2008. Tal Acordo, longe de ser uma fonte de privilégios
para a Igreja ou supor uma afronta à laicidade do Estado, visa apenas dar um
caráter oficial e juridicamente reconhecido da independência e colaboração
entre estas duas realidades. Inspirada pelas palavras do seu Divino Fundador,
que mandou dar «a César o que é de César e a Deus, o que é de Deus» (Mt 22,21), a Igreja exprimiu assim a sua
posição no Concílio Vaticano II: «No domínio próprio de cada uma, comunidade
política e Igreja são independentes e autônomas; mas, embora por títulos
diversos, ambas servem a vocação pessoal e social dos mesmos homens» (Const. Gaudium et spes, 76). A Igreja
espera que o Estado, por sua vez, reconheça que uma sã laicidade não deve
considerar a religião como um simples sentimento individual que se pode relegar
ao âmbito privado, mas como uma realidade que, ao estar também organizada em
estruturas visíveis, necessita de ver reconhecida a sua presença comunitária
pública.
Por isso cabe ao Estado garantir a
possibilidade do livre exercício de culto de cada confissão religiosa, bem como
as suas atividades culturais, educativas e caritativas, sempre que isso não
esteja em contraste com a ordem moral e pública. Ora, a contribuição da Igreja
não se limita a concretas iniciativas assistenciais, humanitárias, educativas,
etc., mas tem em vista, sobretudo, o crescimento ético da sociedade,
impulsionado pelas múltiplas manifestações de abertura ao transcendente e por
meio da formação de consciências sensíveis ao cumprimento dos deveres de
solidariedade. Portanto o Acordo assinado entre o Brasil e a Santa Sé é a
garantia que possibilita à comunidade eclesial desenvolver todas as suas
potencialidades em benefício de cada pessoa humana e de toda a sociedade
brasileira.
Dentre estes campos de mútua colaboração,
apraz-me salientar aqui, Senhor Embaixador, o da educação, para o qual a Igreja
contribui com inúmeras instituições educativas, cujo prestígio é reconhecido
por toda a sociedade. Com efeito, o papel da educação não pode se reduzir a uma
mera transmissão de conhecimentos e habilidades que visam à formação de um
profissional; mas deve abarcar todos os aspectos da pessoa, desde a sua faceta
social até ao anelo de transcendência. Por esta razão, é conveniente reafirmar
que o ensino religioso confessional nas escolas públicas, tal como foi
confirmado no referido Acordo de 2008, longe de significar que o Estado assume
ou impõe um determinado credo religioso, indica o reconhecimento da religião
como um valor necessário para a formação integral da pessoa. E o ensino em
questão não pode se reduzir a uma genérica sociologia das religiões, porque não
existe uma religião genérica, aconfessional. Assim o ensino religioso
confessional nas escolas públicas além de não ferir a laicidade do Estado,
garante o direito dos pais a escolher a educação de seus filhos, contribuindo
desse modo para a promoção do bem comum.
Enfim, no campo da justiça social, o Governo
brasileiro sabe que pode contar com a Igreja como um parceiro privilegiado em
todas as suas iniciativas que visam a erradicação da fome e da miséria. A
Igreja «não pode nem deve colocar-se no lugar do Estado, mas também não pode
nem deve ficar à margem na luta pela justiça» (Encíclica Deus caritas est, 28), pelo que
a ela sempre se mostrará feliz em auxiliar na assistência aos mais
necessitados, ajudando-lhes a livrar-se da sua situação de indigência, pobreza
e exclusão.
Senhor Embaixador, ao concluir este encontro,
renovo-lhe os meus votos de bom êxito na sua missão. No desempenho da mesma,
estarão sempre à sua disposição os vários Dicastérios que formam a Cúria
Romana. De Deus Onipotente, por intercessão de Nossa Senhora Aparecida, invoco
as maiores Bênçãos para a sua pessoa, para os que lhe são caros e para a
República Federativa do Brasil, que Vossa Excelência tem a honra, a partir de
agora, de representar junto da Santa Sé.
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