Enquanto o Nepal se dispõe a finalizar
rapidamente sua nova constituição – cuja data-limite foi estabelecida para
hoje, mas foi prorrogada –, as minorias religiosas se mobilizam contra um
projeto de lei anticonversão que se debate no Parlamento. Apresentado pela
comissão encarregada de reformar o Código Penal nepalês, o artigo 160 prevê
sancionar toda tentativa de conversão ou desvio da religião hindu “por qualquer
método”, informou o boletim Eglises D'Asie em 22 de agosto; se aprovado, qualquer
pessoa que for flagrada pregando outra religião diferente do hinduísmo ou
distribuindo textos religiosos não-hindus, poderá ser condenada a pagar uma
multa de 50 mil rúpias (cerca de 485 euros) e a cinco anos de prisão.
A mesma sanção é contemplada para todo indivíduo que tenha abatido um
bovino para utilizar ou consumir sua carne, uma prática proibida pelo
hinduísmo. Se a pessoa que desobedece a lei for estrangeira, será imediatamente
expulsa.
Estas medidas, sublinham algumas organizações não-governamentais – como Christian
Solidarity Worldwide, protestante –, são ainda mais restritivas que
as leis anticonversão em vigor atualmente em alguns estados da Índia.
Tanto para os cristãos, que se sabem
especialmente no alvo destas medidas, como para os partidários de um Estado
leigo no Nepal, isso supõe uma regressão de mais de meio século, antes da
“abertura ao mundo exterior” de um estado monárquico em que o hinduísmo era a
única religião reconhecida e autorizada.
Um dia depois da sessão parlamentar de 14 de agosto, na qual o projeto
suscitou vivos debates, as minorias religiosas no Nepal anunciaram o lançamento
de uma grande campanha contra o artigo 160, temendo que este não seja votado na
urgência de concluir a Constituição e em razão do caos político causado pela
demissão do primeiro-ministro nepalês, Jhala Nath Khanal, e sua sucessão pelo
maoísta Baburam Bhattarai.
Esta operação de sensibilização foi decidida após uma reunião realizada
em Katmandu na semana anterior, por iniciativa da Igreja Católica e sob a égide
do Interreligious Secularism Protection Movement (IRSPM). Reunindo responsáveis
cristãos, muçulmanos, budistas e baha'i, representantes das principais
comunidades religiosas aborígenes, assim como diferentes partidos políticos, esta
assembleia interconfissional representa uma grande novidade no Nepal. Os
participantes lançaram um apelo ao governo, recordando-lhe que se dispõe a
violar os fundamentos sobre os que se apoia a nova república nepalês e sua
Constituição provisória, que proclamou em 2006 a liberdade religiosa e a
laicidade do Estado.
“Esta proposição de lei vai contra a laicidade do Estado, já inscrita na
Constituição provisória”, afirmou Nazrul Hussain Falahi, líder muçulmano e
coordenador adjunto do IRSPM. “Apesar de que o Nepal tenha se proclamado um
país leigo, continua excluindo as minorias religiosas”, afirmou Palsang Vajra
Lama, monge budista e coordenador da campanha do IRSPM. Unindo-se a outras
minorias religiosas do país, denunciou o fato de que somente as instituições
hindus recebem ajudas do Estado, não sendo reconhecidos como instituições
religiosas os mosteiros budistas, igrejas, templos e mesquitas devido à falta
de um estatuto jurídico claro.
Os líderes religiosos e políticos exortaram também o governo a fazer
prevalecer, como estava previsto na Constituição, as liberdades de religião,
expressão e opinião na futura Constituição nepalês, e a criar uma Comissão de
Assuntos Religiosos, que contemple a representação das minorias não-hindus,
faça que se reconheçam juridicamente e as proteja de toda discriminação.
Às vésperas da promulgação da Constituição nepalês, a mudança recente da
situação político-religiosa veio alimentar os temores das minorias. Após a
euforia que seguiu à queda da monarquia e o rápido aumento das religiões
não-hindus, sob o efeito da laicização do Estado – especialmente as comunidades
evangélicas e pentecostais –, a escalada do extremismo hindu, proporcional ao
avanço do cristianismo, rapidamente marcou o fim da tolerância religiosa ainda
incipiente no Nepal.
A manifestação visível desta violência antirreligiosa foi o atentado
mortal perpetrado em março de 2009 na igreja católica da Assunção, de Katmandu,
por parte do Nepal Defence Army (NDA), um grupo nacionalista
que promulga a volta à monarquia e à religião hindu.
O projeto do artigo 160 se apóia na convicção, reiterada pelos hindus,
de que os cristãos realizam conversões forçadas – uma afirmação refutada por
todas as comunidades cristãs. “É uma teoria sem fundamento e é escandaloso que
o governo a apoie”, indignou-se Isu Jang Karki, que lidera a Nepal
Christian Society, a mais importante federação de igrejas
protestantes do país.
“A lei não é contra os cristãos que realizam grandes serviços ao nosso
país – disse à agênciaAsiaNews o ministro da Justiça, Prabhu
Sah –, mas contra a hegemonia crescente do cristianismo.” Informou que os
hindus e budistas se lamentam pelas práticas agressivas de conversão de algumas
comunidades protestantes. “Estas queixas não se referem aos católicos”,
esclareceu.
Fonte: Zenit
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