sábado, 7 de maio de 2011

Homilia do Terceiro Domingo da Páscoa


   Hoje os discípulos de Emaús tiveram um encontro especial. Todo Domingo também temos um encontro especial com Cristo; às vezes chegamos como que cegos, imersos em tantas preocupações e desilusões que nem percebemos Jesus em nossa frente, ao nosso lado; ainda assim, Ele está no meio de nós!
  A primeira cena do Evangelho de Lucas nos apresenta dois discípulos do Senhor que caminham rumo a Emaús. Eles estão tristes, desorientados. O desânimo e a falta de esperança tomaram conta de seus corações. Vão pelo caminho conversando sobre tudo o que aconteceu a Jesus: sua entrega, sua crucificação, sua morte e até mesmo o sumiço de seu corpo; talvez um consolasse o outro, talvez os dois chorassem, talvez ambos estivessem revoltados com a situação...
  É neste momento de muitas perguntas e poucas respostas, de muitas inquietações e poucas certezas, de muita desolação e nenhuma esperança, que lhes aparece um desconhecido peregrino. Este se põe no caminho dos caminhantes e no mesmo ritmo de seus passos.
  O rosto triste dos homens, desperta o interesse do peregrino que pergunta: “O que estão conversando?” E um chamado Cléofas, um pouco exaltado e revoltado com tudo o que acontecera, lhe responde um tanto rispidamente: “ Tu és o único em Jerusalém que não sabe o que aconteceu?” E o peregrino retruca : “Que foi?” A partir daquele momento os discípulos são conduzidos não apenas a Emaús, mas à fé; o Mestre dá continuidade ao seu ensino. Naquele momento, os discípulos fazem uma verdadeira Páscoa, isto é, uma “passagem”: passagem da cegueira à visão, passagem da nesciência (do não saber) à inteligência, passagem do desânimo à esperança, passagem da tibieza ao fervor, do ódio ao amor...
  Mas o que será que impediu aos discípulos verem o Senhor naquele peregrino? A resposta é dupla: O que os cegou foi a tristeza e a falta de fé. Existem dois tipos de tristeza, uma que aproxima de Deus e outra que afasta de Deus. A tristeza que aproxima de Deus é aquela que sentimos quanto à nossa pobreza, quanto à nossa infidelidade ao que Deus espera de nós: ficamos tristes por ainda sermos pecadores e de ainda não sermos plenos de Deus e isto nos faz procurar mais o Senhor, buscá-lo nos sacramentos, nos sacrificarmos pela conversão pessoal. É uma “nostalgia de Deus”, uma dor por ainda não estarmos unidos a Ele. A outra tristeza, a que afasta de Deus, é a tristeza da decepção, da solidão, da revolta, da falta de esperança. Decepção diante daquilo que não era o esperado. Solidão quando se pensa estar só diante da dor. Revolta pela injustiça e impunidade não condenadas... Falta de esperança, quando não se quer caminhar para uma nova perspectiva, para o novo, quando se abraça o velho e nos apegamos ao pessimismo. Nisto tudo estavam metidos os discípulos de Emaús. Suas palavras assim os definiam: “Nós esperávamos que Ele fosse libertar Israel, mas já faz três dias que todas essas coisas aconteceram...” Eles não esperavam mais e se não esperam mais, não davam lugar à fé. Sem a fé, não existe enamoramento de Deus, não existe esperança, somente a dura realidade da vida.
  Irmãos, também em nossa via, em nosso caminho o Senhor deseja nos acompanhar; num momento de perguntas sem respostas, de dúvidas sem certezas, de desolações sem esperanças, o Divino Peregrino quer por-se ao nosso lado e percorrer a trilha de nossas vidas, segundo o ritmo de nossos passos - não irá nem atrás nem à frente, irá ao nosso lado! É verdade, porém, que os caminhos que trilhamos nem sempre nos levam ao bem ou ao melhor e que algumas coisas na vida nos roubam o sorriso e nos entregamos à tristeza... Mas o Divino Peregrino dirá, como disse aos caminhantes de Emaús: “Que foi?” “O que está acontecendo?” O nosso rosto triste desperta o interesse de Deus mais ainda por nós! Hoje, neste momento, fazer a Páscoa é imprescindível, fazer a experiência da Passagem: Passe a desconfiança! Passe a tristeza! Passe a falta de fé! Passe o desânimo! Passe tudo o que não nos deixa ver a Deus do nosso lado!
  Não poderemos nos abrir a Deus e à felicidade autêntica, se ainda deixamos que a decepção tome conta de nós e que nos lance na solidão escura; quantas vezes esperamos tanto de Deus e dos outros e não recebemos o que queríamos... Isso não nos pode abalar! Não veremos a Deus, nem teremos alegria, se a revolta nos ditar palavras e gestos e a falta de esperança nos cobrir o coração! Se isto nos acontecer, o Divino peregrino, angustiado e cheio de zelo nos dirá, como aos discípulos de Emaús: “Como sois sem inteligência e lentos para crer...”  Irmãos, não é esta muitas vezes a nossa realidade? Sem inteligência para compreender os outros e o planos de Deus? Lentos para acreditar na Providência divina e para exercer o amor entre nós? Sem inteligência... Lentos...
  O Senhor teve que percorrer, além do caminho para Emaús, as páginas da Escritura para exortar aqueles. Hoje, o Senhor faz o mesmo conosco: nos apresenta a Bíblia como um instrumento para se chegar a Ele. E já estamos quase chegando ao fim, quase chegando a Emaús. Os discípulos fizeram sua Páscoa, abandonaram a tristeza, se encheram de esperança, entenderam no seu caminho o caminho de Deus, cresceram em inteligência e apressaram seus passos. Eles estão diferentes e devem isto ao Peregrino, ainda não revelado. E fazem esta prece, sem se aperceberem: “Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando!”
  O Peregrino, solícito e atencioso, atende e entra naquela morada. Ao partir o pão, os discípulos O reconhecem e com que alegria não deveriam ter exclamado: “Aquele que caminhou conosco, que nos acompanhou na dor, que nos tirou a tristeza, que nos explicou as Escrituras, que nos trouxe novo alento, que renovou nossa fé, que nos deu sabedoria e nos tirou a lentidão era Jesus!” É Jesus, irmãos, e será Jesus, que irá hoje fazer o mesmo conosco! Basta que digamos a Ele: “fica conosco!” Fica conosco, Jesus, pois parece que é tarde para vencer nossos pecados! Parece que é tarde para converter nossas famílias! Parece que é tarde para vencer os vícios! Parece que é tarde para pedir desculpas! Parece que é tarde para nos voltarmos para Ti, Deus de amor!
A noite vem chegando, Senhor... A escuridão do medo, da angústia, do desespero, da dor... Por isso, “fica conosco!” “Faz arder nosso coração”, como fizeste aos discípulos de Emaús e faze-nos Te encontrar na Eucaristia, Pão partido em nosso meio! Como entraste solícito e cheio de bondade naquela morada, entrai hoje, agora, na minha casa, no meu coração e faz aqui tua morada permanente.
  O Evangelho terminou nos dizendo que após aquela experiência, os discípulos se levantaram e voltaram para Jerusalém na mesma hora. Eles não descansaram da viagem, não terminaram a refeição, não esperaram o raiar do dia! A presença de Jesus no meio deles os impulsionou para a missão: foram anunciar a Cristo ressuscitado! Nós devemos fazer o mesmo: Depois da Missa, a missão! E digamos, ao partir, como Sto. Agostinho: “Ensinai-me o que devo aprender e ensinai-me o que devo ensinar!” Assim seja!

“Se tu vais agora, anoitecerá;
Se tu vais embora, Senhor o que será?
Se tu vais agora, anoitecerá;
Mas se permaneces, a noite não virá!

A sombra vai se abrindo, quando a noite cai e vão fugindo tantas luzes de um dia que jamais há de se acabar, de um dia que há de começar sempre, porque sabemos que uma nova vida, aqui nascida, ninguém mais cancelará.”
  
                  

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